Em Urbanamente, o eu-lírico parece usar de autoironia para fazer valer a ideia de que a vida urbana é plausível ou pelo menos possível. Porém, a verdade por trás dessa ironia é que o faz dizer adeus.
Por outro lado, no poema O Nômade, o eu-lírico parece investir no ímpeto de se expandir, florescer, abrir-se para o todo. Aqui a ironia foi embora; fala-se em direto, busca-se a força para conviver no caos, e é o caos que alimenta mais que a paz. Mesmo assim, este inquieto, este insolente, este atrevido não deixa de dizer adeus.
Já A Testemunha do Tempo era um além-do-homem. Apenas alegoria que, de estratosférica, ninguém enxergava. Teve incursão pelo desconhecido, por situações inauditas, atravessou os pontos cegos da vida, mas não foi nunca vista, como se fosse invisível. Por isto, também insistiu em dizer adeus.
Assim, esta mesma persona ainda exibe a força que em vão perdera e se faz Plural para proferir vozes através do silêncio e entrelaçar seu impulso com o da alteridade para fazer ouro. É um poema assim enigmático. Um claro enigma que a faz insistir em dizer adeus.
Por fim, o eu-lírico sai de si mesmo para contar a longa história de Conceição no poema. Neste caso, como poderá notar, não é apenas ele que diz adeus, mas também Conceição, com uma palavra curta. Vê:
CABOCLA
Conceição não era feia.
Conceição não era freda,
Conceição não era imaculada, não.
Deixou epitáfio para dizer que sabia
Não só viver como morrer feliz.
Dizia assim:
“Morri, morri…
Para que alguém melhor que eu nascesse”.
Conceição não era pedra.
Conceição era suave
Como uma mulher qualquer,
Que se propõe
A acordar sorrindo,
A levantar para o primeiro dia.
Conceição era high-tech
Se juntava com moleques
E ouvia rock‘n’roll.
Conceição me abraçou
Naquela noite de adeus
E me deixou como eu sou,
Não arrancou nada de mim.
Amanhã será memória
Que toma o peito como perfume
E vai desaparecendo
Parecendo um sabor que some da boca.
In: Castro, João Rosa de. Adeuses: São Paulo, 2006.
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