Amargo & Inútil: se as inteligências bastassem, a humanidade não se corrompia
Como foi dito em uma publicação anterior deste Pedra de Toque, é bem provável que haja dilema entre o eu e o outro. Parece ser desse fato que naturalmente surge isto que chamamos corrupção, a qual, às vezes, surge na forma da repressão ou do abuso de um pelo outro dos dois elementos citados. Mas este livro tendia a falar da natureza dos brasileiros. Atualmente é que Castro parece ter expandido seu espectro de percepção e passado a considerar “muito inteligentes” não só os brasileiros, mas também os seres humanos.
Ocorre, porém, que as inteligências já identificadas não bastam. Estão inventando outras (inteligência emocional, inteligência artificial), e o autor até vem apontando outra (baseada na psicanálise): inteligência sexual.
A perspectiva que ainda mantém todos atentos é que ninguém parece muito contente com a própria deterioração, seja física ou mental. O que os homens procurarão, portanto, e sempre, é a solução para este problema da corrupção aparentemente intrínseca à natureza humana. Fica então aqui um problema de tese de livre-docência: existe alguém que nunca se corrompeu?
REFLEXÃO MANUAL
Eu, que alcanço o mundo,
no fundo,
no fundo,
fujo de mim,
que por ele sou alcançado.
A minha derrota funde
com a vitória que gritam.
Este Brasil amanheceu mais vivaz;
acontecendo, porém,
como os submundos acontecem.
Enquanto os senhores discutiam
a pauta do dia,
a ordem do dia,
a festa do dia,
um Túlio,
um Avelino,
uma certa Julieta
ou Cecília escarafunchavam os
arquivos da realidade
e descobriam novos frutos
nunca jamais never ever
saboreados pela pessoa humana,
nem pela sobre-humana.
Eu, que alcanço o mundo,
no fundo, no fundo,
nada valho
quando penso em
pôr um preço na testa
e seguir pelas ruas
a distribuir relíquias
a troco de esmolas,
dividendos,
cachês,
ordenados,
patentes,
salários,
royalties,
reajustes,
copyrights,
todas essas coisas
que forram bem o estômago.
Eu seguia
com o estômago forrado
saltando dum castelo para o outro
fingindo não ver
a decadência instalada
entre os castelos.
Eu alcanço o mundo.
Creia nisto.
O seu rosto expressa tanta dúvida,
tanta dúvida,
tantas dúvidas,
que me sinto compelido
a manifestar-me
dessa maneira atroz.
Perdão.
Um dia vou-lhe derramar
cores de uma alegre aquarela.
Por ora, porém,
só posso garantir
que nossa gente
é sóbria e feliz
porque sua inteligência é
contínuo passatempo.
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